Lava Jato tem pânico de pressão internacional; Por Paulo Moreira Leite
Explicando. Assim que o depoimento chegou às redes sociais, a senadora gaúcha Ana Amélia recuperou o relho verbal que usara para estimular agressões fascistas contra a caravana de Lula no Sul para dizer: “espero que essa exortação não tenha sido para convocar o exército islâmico a vir ao Brasil proteger o PT”.
Na mesma linha, o deputado major Olímpio, estrela do bolsonarismo-2018, apresentou denúncia ao Ministério Público Federal, alegando que o vídeo configurava crime contra a Segurança Nacional. O MP abriu um procedimento preliminar que, em tempos de normalidade democrática, estaria destinado ao arquivo morto pelo ridículo. Nos dias atuais, quando até um Premio Nobel da Paz como Adolfo Perez Esquivel foi duas vezes impedido de encontrar-se com Lula, restando a manhã desta 6a feira como última possibilidade de uma visita, nenhum absurdo pode ser descartado – pois acusações bombásticas, mesmo sem fundamento legal algum, são um ótimo ingrediente para elevar a pressão contra Lula e seus direitos, ainda que desta vez estejam confundindo Al Jazeera com Al Fafa, como sintetiza o deputado Paulo Pimenta.
Ao impedir uma visita de Esquivel, a Lava Jato segue a mesma linha de intervenção aplicada a Lula: todo esforço consiste em tentar tornar o Premio Nobel da Paz invisível.
Não custa recordar alguns fatos essenciais.
O presidente Lula foi mandado para a prisão para cumprir uma pena de 12 anos e um mês em regime fechado, após um julgamento sem crime demonstrado, no qual as garantias previstas na Constituição não foram respeitadas. Nesta situação, a senadora Gleisi Hoffman tem todo direito de denunciar a prisão de Lula, dentro e fora do país. Até porque de 55% da população brasileira que, conforme levantamento do instituto Ipsos concorda que "a Lava Jato faz perseguição política contra Lula".
Não há nada para ser criticado aqui. Muito menos para ser investigado pelo Ministério Público, como se fosse possível dirigir e censurar as opiniões de uma senadora eleita por 3,1 milhões de votos, em 2010.
Depois de produzir, meia dúzia de vídeos que foram divulgados em outros países, em várias latitudes, Gleisi tem motivos de sobra para se dirigir aos países árabes, com os quais Lula e seu partido têm uma relação especial de convivência e solidariedade. Sem jamais ter descuidado de laços com históricos com o Estado de Israel, no governo Lula ocorreu a necessária aproximação com os países que produziram uma imensa corrente migratória em direção ao Brasil, com uma contribuição inegável para nossa economia e nossa cultura, na medicina e na literatura, sem falar na culinária. Antes de Lula, o comércio entre o Brasil e o Oriente Médio era uma ninharia econômica, da ordem de 2 bilhões de dólares. Cresceu cinco vezes nos oito anos de governo Lula, passando a 10 bilhões.
Num esforço para encontrar erros no vídeo de Gleisi, o Globo encontrou dois. Para ficar num exemplo: ela disse que Lula foi o único presidente brasileiro que fez uma visita a todos os países do Oriente Médio. O “erro” dela foi esquecer duas visitas mais rápidas de Dilma.
No vídeo, Gleisi lembrou que o Partido dos Trabalhadores sempre foi favorável a criação de um Estado Palestino. Pode parecer espantoso, subversivo, terrorista. Não, major Olímpio. Não, Ana Amélia. A ONU defende um Estado palestino desde 1947, quando autorizou a criação de Israel. Reforçou essa proposta em 1967, após guerra dos Seis Dias.
Na realidade, para quem pretendia defender Lula, Gleisi foi até modesta. Deixou de destacar uma iniciativa concreta de Lula pela paz. Isso ocorreu em 2009 quando, ao lado do governo da Turquia, Lula participou de negociações com o Irã pelo controle de pesquisas nucleares, chegando a um acordo provisório, que serviu de inspiração para um pacto assinado mais tarde, menos efeito que o original. Como se sabe, Lula não agia por conta própria, mas com estímulo de Barack Obama, então presidente dos Estados Unidos.
Os ataques a Gleisi expressam o receio claro da Lava Jato e seus aliados diante da grandiosa campanha internacional pela libertação de Nelson Mandela, uma das maiores da história. O mesmo temor está por trás do tratamento pouco respeitoso ao Premio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel.
Nem todos se recordam, mas Mandela era um ilustre desconhecido fora da África do Sul em 1964, quando foi condenado a prisão perpétua. Deixou o cárcere vinte e sete anos depois, em 1991, depois que uma campanha internacional contra o apartheid e por sua libertação ganhou força planetária, incluindo boicote ao comércio com a Africa do Sul. A cúpula dos governos desenvolvidos se dividiu: Ronald Reagan e Margareth Tatcher sustentaram o Estado racista até o fim dos seus dias, com apoio de aliados menores, enquanto partidos e governos progressistas marchavam pelo outro lado. Sob o governo de François Mitterrand, e impulso da primeira dama Danielle Mitterrand, uma das maiores passeatas da história da França tomou as ruas de Paris para pedir liberdade para Mandela.
Verdade que Lula possui, hoje, uma estatura internacional que Mandela só adquiriu após longos anos de prisão. Enquanto Lula já recebeu 230 000 assinaturas favoráveis a sua indicação ao Nobel, Mandela foi laureado em 1993, dois anos depois de sair da prisão, e dividiu o Premio com o primeiro ministro sul-africano com quem dividiu a transição para o fim do apartheid. As denuncias sobre terrivel rotina na prisão ajudou na sistematização da plataforma internacional minima de direitos de prisioneiros, que leva seu nome.
No universo conservador em alta em boa parte da Europa e nos Estados Unidos de Donald Trump, o mundo também é outro, com ventos políticos diferentes daqueles que sopravam há 40 anos.
Não deixa de ser sintomático que, no esforço para manter Lula silencioso e invisível, a Lava Jato tenha ignorado até a Regra Mandela, assumida pela ONU como plataforma internacional mínima de direitos de prisioneiros.
Como se vê
Por: Paulo Moreira Leite
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